A Reforma Administrativa de Fernando Henrique Cardoso (Emenda Constitucional nº 19), em 1998, propôs o fim do Regime Jurídico Único para contratação de servidores públicos. PDT, PSB, PT e PCdoB questionaram a EC 19 com a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 2.135 e obtiveram uma liminar favorável que teve o mérito julgado pelo Supremo Tribunal Federal em novembro de 2024. O STF julgou constitucional a EC 19, autorizando mais de um regime de admissão de servidores públicos. As diversas consequências dessa decisão foram apontadas pelo advogado e assessor de diversas entidades sindicais de servidores públicos estaduais e federais, Luiz Fernando Silva, durante o Curso de Formação do Sindprevs/SC realizado virtualmente em 5 de dezembro de 2024. O curso também contou com a palestra do economista e professor Afrânio Bopré, tratando da conjuntura política nacional e internacional.

“É fundamental olhar para o passado para projetar o futuro”. Luis Fernando citou esta frase antes de falar do cenário histórico vivido pelos servidores públicos antes da promulgação da Constituição de 1988 e a instituição do Regime Jurídico Único, em 1990. “A unificação dos regimes de contratação despertou um sentimento de categoria nesses servidores que levou à criação de várias entidades representativas nacionais, como a Fenasps, a Fasubra, a Condsef, e o Andes. Nós sabíamos que sem a unificação dos direitos dificilmente nós teríamos um movimento sindical expressivo e forte.”

Antecipando a Reforma Administrativa

“O fim da RJU é uma modificação profunda na organização da administração pública. A União, estados e municípios estarão livres para decidir pela criação de outros regimes de contratação. Na prática começarão a cair os princípios do concurso público e da estabilidade no emprego” alertou Luis Fernando. Ele lembrou que um dos objetivos da Reforma Administrativa (PEC 32/2020), barrada pela mobilização dos servidores, é justamente permitir a contratação por diversos regimes, segregando os servidores em carreiras típicas e atípicas.

Assim como a Lei 8.112, que instituiu o RJU, colocou todos os cargos e empregos anteriores numa única Lei em 1990, com o fim do RJU poderá acontecer o inverso: os servidores poderão ser segregados em diversos modelos de contratação. Luis Fernando avalia que é juridicamente possível que isso ocorra. Vai depender do conteúdo do Acórdão a ser publicado pelo STF: transformação generalizada ou manter a contratação pelo RJU só para as carreiras típicas de estado.

Financeiramente insustentável

“Se os novos servidores forem contratados pelo regime CLT, farão parte do Regime Geral de Previdência Social e não vão aportar para o Regime Próprio. Sem a entrada de novos servidores, no curto prazo, o Regime Próprio se tornará insustentável financeiramente. É preciso três servidores em atividade para cada aposentado para manter o equilíbrio atuarial.” Ou seja, o fim do RJU também vai mexer com a sustentação financeira do sistema de previdência dos servidores. A última Reforma da Previdência (Emenda Constitucional nº 103, de novembro de 2019) permitiu contribuições extraordinárias até para os atuais aposentados e pensionistas para garantir o custeio do regime, destacou Luis Fernando.

Com diversos regimes de contratação, haverá novas e maiores dificuldades nos momentos de greve ou de negociação coletiva, explicou o advogado e assessor. “Se tivermos dois regimes, os direitos serão diferentes e as negociações poderão ser separadas com organizações sindicais diferentes. Haverá uma corrida para criar sindicatos que representem esses servidores.” Outra parcela de trabalhadores até então ignorada, os terceirizados e temporários, precisarão ser reconhecidos e representados. Afinal a terceirização da atividade meio já é permitida por lei desde 2019. Luis Fernando afirmou que nesse cenário ficará difícil definir qual tribunal julgará as greves ou a negociação coletiva. Para o advogado essa foi uma grande lacuna deixada pelo Constituição de 88. “Ela permite a sindicalização e o direito de greve, ou seja, permitiu o conflito, a diferença de interesses entre a administração pública e os servidores, mas não incluiu o mecanismo através do qual se solucionam os conflitos que é o direito à negociação coletiva”.

Embargando e mantendo

Luis Fernando avalia que “a luz no fim de túnel” é fazer as entidades nacionais do funcionalismo público cobrarem dos partidos que ajuizaram a ADI 2.135/DF que embarguem a decisão do Supremo Tribunal Federal, quando for publicada. “Coloquem embargos sobre embargos porque enquanto o Acórdão não for definitivo a gente vai mantendo o RJU, e incluindo nas negociações nacionais que o governo mantenha a contratação pela Lei 8.112.”  Para finalizar, ele lançou um questionamento “De que vai adiantar vocês estarem discutindo Carreira do INSS se a administração pública acabar como a conhecemos? Se tudo for privatizado, para que todo esse empenho com os Programas de Gestão? O fim do RJU é muito mais importante que os problemas imediatos.”

Mais de 60 pessoas acompanharam na sala virtual, a palestra promovida pelo Departamento de Formação Sindical e Estudos Socioeconômicos do Sindprevs/SC, no dia 5 de dezembro. Servidores de outros estados e de outras categorias prestigiaram o curso que abordou a “Organização sindical, data-base e negociação coletiva” e também contou com a palestra do economista e professor Afrânio Bopré sobre a conjuntura nacional e internacional, que abordaremos em outro texto.

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